Há quem diga que a praxe académica, na medida em que estabelece uma hierarquia entre os estudantes, é uma das mais cruéis formas iniciáticas que fomenta o espírito elitista tão caracterizador da sociedade ocidental. Para os defensores desta teoria, a praxe é violência psicológica; é segregação e humilhação; é a maneira de fazer o caloiro sentir-se inferior. Sem dúvida que, sob este ponto de vista, a praxe parece algo extremamente negativo, uma atitude de poder que se deve, a todo o custo, reprovar.
Na minha opinião, esta é uma visão bastante redutora e simplista da praxe, a visão daqueles que querem, forçosamente, ser diferentes, afirmarem-se independentes, mas que, bem lá no fundo, desejam tudo aquilo que os outros desejam. Acima de tudo, a praxe é convívio entre as pessoas; é camaradagem e amizade; é demonstrção de sentimentos; é o modo, por excelência, de integração num curso.
Nunca vi a praxe como algo a que os "doutores" recorrem para afirmar a sua suposta superioridade perante os caloiros. Sei que, por vezes, isso também acontece; há sempre pessoas que se servem da sua posição académica para ridicularizar os primeiranistas. Contudo, essas pessoas não constituem a maioria e, até mesmo algumas delas, apesar do aparente tom autoritário que possam fazer transparecer ao início, desejam realmente que os caloiros bebam, até à ultima gota, o néctar académico, o espírito inebriante das festas, das jantaradas, das Latadas, das Queimas...
Todos têm, numa sociedade democrática, o direito de se pronunciar a favor ou contra a praxe, e é, por essa razão, que surgem os chamados "anti-praxe". É uma opção de vida, e eu aceito-a, mas recuso-me a simpatizar com ela. Para mim, a passagem pela Universidade (a de Coimbra, claro!) é muito mais do que o tirar de um curso. A vida académica conimbricense é, quando vivida intensamente, um doce momento da nossa existência. Os amigos, as farras, as noites mal dormidas, até mesmo as bebedeiras são sempre importantes. A vida é feita de experiências, e as más servem como lição.
Não estou aqui, de modo algum, a proclamar a defesa da brincadeira, do facilitismo, da alienação a que muitos dos estudantes universitários do nosso país se votam, mas também não devo deixar de dizer que abomino completamente o estudo doentio, competitivo e sem escrúpulos de alguns pseudo-intelectuais frustrados da vida. Afinal de contas, e apesar da inevitável Saudade que hoje sinto pelo fim da vida académica, é reconfortante saber que os becos, ruelas e calçadas de Coimbra terão, para todo o sempre, histórias nossas para contar!
3 comentários:
Dura praxis sed praxis
Amizade, Convívio, Festas... Nada isso tem que ver exclusivamente com a praxe. Parece-me que a praxe é cada vez mais a minoria. Mas eu sou suspeita. Nunca liguei a esse tipo de ritual estudantil.
Não tenho uma visão extremista da praxe, por isso não considero que seja só violenta. Claro que também tem os seus aspectos positivos.
Tudo o que signifique estabelecer laços de amizade é positivo. Mas, quem julga que se não fosse a praxe estes laços não existiriam ou não seriam tão fáceis não conhece bem o ser humano. Todas as pessoas que convivam têm tendência para começar logo uma conversa e uma amizade e os jovens fazem-no com enorme facilidade.
Mas tens razão, a praxe não é por si só violenta. Mas então por que será que se sente necessidade de defender a praxe? Porque, de facto, são praticados muitos actos de violência psicológica, tão mais grave quanto mais só e indefesa se sentir uma pessoa.
Não é obrigatório que praxe seja praticar actos vergonhosos e humilhantes. Sou completamente contra qualquer acto que seja humilhante para outra pessoa. E, não ignorar que é disso que se tratam as "melhores" praxes. Por isso não concordo com a praxe. Mas concordo com o que seja realmente recepção e integração de qualquer pessoa em qualquer local.
Apesar de concordar que a praxe é um dos veículos de integração e convívio entre caloiros/veteranos e de ter sido uma caloira fiel e empenhadíssima, vejo-me obrigada a alertar para um aspecto (bastante) negativo da praxe. Quem se auto-entitula "anti-praxe" (e com todo o direito) acaba por ser, de alguma forma, discriminado. Isto porque não é somente a praxe que este perde, mas também todos os outros momentos de convívio (jantares, festas,...) Por se ser anti-praxe não deveria significar que se deixe de ser convidado para eventos que devem estar ao alcance de qualquer estudante.
E tomar isto como uma consequência inevitável da opção "anti-praxe" é pura e simplesmente uma forma subtil de pressão que se exerce sobre qualquer recem-universitário.
basicamente "ou queres-te integrar e alinhas nas praxes, ou declaras-te anti-praxe e não serás convidado para nenhum jantar ou festa.. és livre de escolher"
p.s. desculpa a invasão, mas adorei o blog!
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